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domingo, 27 de janeiro de 2019

Miniatura DC Série Especial Nº 15 - Monstro do Pântano

Miniatura DC Série Especial Nº 15 - Monstro do Pântano

Quando entendi quem e o que era o Monstro do Pântano, minha cabeça explodiu!

Nâo há outra forma de expressar o que aconteceu comigo quando entendi a grandeza e a profundidade deste que é um dos personagens mais interessantes, atual e sintonizado com as demandas de nosso tempo. Criado por Len Wein e Berni Wrightson em 1971, o Monstro do Pântano tinha histórias muito boas voltadas para o mundo do sobrenatural. Com o passar do tempo, no entanto a tendência foi o personagem iniciar uma queda na direção das baixas vendas. Em 1984, Alan Moore assumiu o título e tudo caminhou na direção de transformar o personagem em uma gigantesca força motriz dramática, incrível e profundamente relevante. Falar a respeito do Monstro do Pântano é muito mais que discorrer sobre um personagem ficcional, é trazer à mesa as ideias (das quais compartilho) do Biólogo Naturalista Britânico Rupert Sheldrake, que em seu incrível livro A Presença do Passado, expõe suas teorias a respeito dos Campos Morfogenéticos. Alan Moore busca ali sua inspiração e coloca o Monstro do Pântano no epicentro destas ideias. Vamos hoje conhece-las e entender quem e o que é este que talvez seja Monstro apenas no nome. 

Miniatura DC Série Especial Nº 15 - Monstro do Pântano

A miniatura que representa este gigante das charnecas dentro da Coleção de Miniaturas de Metal da Eaglemoss é talvez uma das mais belas da coleção. Além de suas proporções serem maiores que o das peças da Coleção Regular, sua modelagem, cor e detalhes são impressionantes. A peça traz uma grande variedade de raízes que se espalham pelo corpo, unindo-se em poderosos caules maiores na região dos pés, mimetizando raízes robustas. Além destas raízes pelo corpo, há uma rugosidade ao longo de toda a peça que, associada à cor verde "musgo", produz uma sensação muito próxima de um emaranhado de plantas, musgos, líquens e raízes. É esta sensação que nos faz associar a peça à alguém que encarna a força da flora de nosso mundo. Na região superior das costas é possível identificar pequenas folhas e tubérculos que fazem parte da própria criatura. Estes detalhes também nos permite pensar que este ser talvez seja algo semelhante à simbiose entre o homem e uma planta. Confesso que quando vi esta peça à venda na Eaglemoss Britânica há alguns anos, não resisti e a importei, já que na época não sabia se a coleção iria vir em sua totalidade para o Brasil.

Miniatura DC Série Especial Nº 15 - Monstro do Pântano

O Monstro do Pântano nasceu em 1971 com uma origem que pouco se diferenciava de outras trágicas origens dos monstros da literatura. O casal de Botânicos Alec e Linda Holland pesquisavam uma fórmula "biorestauradora" que poderia potencializar incrivelmente o crescimento e a produção de alimentos no mundo. Um organização criminosa (O Conclave), infelizmente cobiçava a fórmula. Em um ataque ao laboratório secreto dos Hollands (localizado próximo aos Pântanos da Louisiana nos Estados Unidos), o local explode, matando Linda e deixando Alec em chamas que, em desespero, corre para o Pântano e lá se joga. Todos deram Alec como morto, no entanto ao redor de seu corpo embebido pela fórmula biorestauradora, forma-se uma estranha composição que por fim ressurge como um verdadeiro Monstro. A criatura guardava ecos e memórias de quem havia sido Alec Holland, inclusive com o tempo percebe-se como sendo o mesmo Alec, só que agora vivendo em uma nova realidade monstruosa. A primeira série de histórias do personagem, tendo Len Wein à frente, dava conta da vingança de Holland junto ao Conclave e seu encontro com pessoas e forças sobrenaturais que queriam captura-lo e estuda-lo. Nesta fase destaca-se aquele que viria a ser um dos seus mais perigosos inimigos, o feiticeiro Anton Arcane.

Miniatura DC Série Especial Nº 15 - Monstro do Pântano

Em 1984 era mais ou menos assim que a mitologia do personagem se encontrava. Até que o jovem Alan Moore assumiu o título. Mas do que se trata a Teoria dos Campos Morfognéticos de Ruppert Sheldrake? Segundo Sheldrake a totalidade das experiências aprendidas pelas espécies não apenas passam a fazer parte de seu patrimônio genético, tais experiências se estruturariam também em campos ao redor de nós (seja ao redor da vida vegetal ou animal), constituindo um cinturão pulsante de experiências, lembranças e sensações. Algo muito parecido com o "Mundo das Ideias" de Platão. Memórias, assim como características físicas herdadas de nossos antepassados, também poderiam ser passadas de geração em geração. Conceito aliás, muito usado hoje dentro das terapias de "Constelação Familiar". A ideia da existência deste campo permitiu a Moore que inserisse o Monstro do Pântano como aquele que encarna a coletividade da FLORA ou VERDE do Planeta Terra. Ele nada mais é do que a encarnação viva da consciência verde de nosso Planeta. A tradição literária tende a chamar seres assim de "Elementais", ou seja, um ser que encarna um dos elementos primordiais da vida, nesse caso a flora planetária.

Miniatura DC Série Especial Nº 15 - Monstro do Pântano

As primeiras histórias com Alan Moore à frente do Monstro do Pântano em 1984, ganharam prêmios prestigiosos na Indústria dos Quadrinhos, e narravam a descoberta pelo Monstro do Pântano de que na verdade ele não era Alec Holland. Que na verdade ele possuía apenas ecos das memórias do corpo que lhe serviu inicialmente como constituinte. Que na verdade ele era um Avatar da FLORA de nosso Planeta. Nas primeiras histórias acompanhamos o luto vivido pelo personagem ao perceber que o que ele chamava de humanidade dentro de si era apenas um eco, um resquício. As histórias de Moore vão então num crescendo, levando o personagem a descobrir todas as suas potencialidades, como por exemplo a capacidade de viajar dentro do Campo Morfogenético do Verde. Um local que ele podia acessar, por exemplo, usando qualquer vida vegetal que estivesse próxima. Assim, quando dentro do Campo Morfogenético, é como se ele pudesse estar em todo Planeta ao mesmo tempo, compartilhando da consciência coletiva de todos os vegetais existentes em nossa biosfera.

Miniatura DC Série Especial Nº 15 - Monstro do Pântano

Imagine, portanto um ser capaz de expandir sua consciência neste nível, capaz de perceber as nuances do coletivo verde planetário, e capaz de controla-lo. Nas histórias que se seguiram, o personagem fez uso algumas vezes de seu poder sobre o verde para conter ameaças, como por exemplo do Homem Florônico. Um ser que conseguiu atingir um certo nível de acesso ao mesmo campo ao qual o Monstro tem seus poderes ligados. As ocasiões em que o VERDE foi acessado pudemos ver o poder coletivo da flora de nosso mundo. Por vezes, aliás torcemos até para que este verde ensine ao homem algumas lições sobre o câncer da ganância, da falta de respeito pelo meio ambiente, da falta de senso coletivo ao se achar a espécie alfa em nosso planeta. Em tempos de desrespeito ambiental, de desrespeito à vida humana e aos ecossistemas, o Monstro do Pântano é mais do que relevante, é imprescindível enquanto metáfora para nosso aprendizado.

Miniatura DC Série Especial Nº 15 - Monstro do Pântano

Para o leitora da DC, é comum perceber nas histórias do Monstro do Pântano personagens místicos que foram ganhando expressão e hoje são tão incríveis quanto ele, por exemplo, John Constantine, Desafiador, Etrigan, Vingador, Espectro... Com o passar do tempo, outros conceitos foram expandidos a partir das ideias iniciais de Alan Moore, como por exemplo a existência do Parlamento das Árvores. Um local escondido dentro da Selva Amazônica Brasileira no qual estão enraizados Monstros do Pântano de outras Eras da Terra. Elementais do verde que já existiram e que, após seus anos de serviço, se dirigiram até esta região brasileira remota para se enraizar. O conjunto destes seres, e as decisões ali tomadas dirigem as ações do Elemental atual. O Parlamento das Árvores seria algo como o coração da flora de nosso planeta.

Miniatura DC Série Especial Nº 15 - Monstro do Pântano

Não posso deixar de expressar minha admiração pelo desenvolvimento dramático e ficcional que Alan Moore alcançou com o Monstro do Pântano. Mais... Não posso deixar de expressar a sensação que me acompanha desde criança quando morava em fazenda e escutava o coração da mata pulsar como se estivesse viva ao meu redor. Uma entidade viva com a qual o ser humano perdeu um contato mais íntimo (em função de algum erro que cometemos como espécie no passado quem sabe). Cresci imaginando se não haveria um jeito de nos reconectarmos com este campo que a tudo permeia durante nossa vida (tal qual vimos acontecer no filme AVATAR de James Cameron). Quando conheci o Monstro do Pântano de Alan Moore e as ideias de Ruppert Sheldrake, percebi então que talvez (quem sabe um dia) consigamos este acesso novamente!!

segunda-feira, 21 de janeiro de 2019

Supremo - A Era de Bronze


Do que são feitos os quadrinhos de Super-heróis? Em minha opinião de ideias e de ideais. No entanto, com o passar do tempo, das décadas, das inúmeras abordagens, das inúmeras influências externas, observou-se padrões diferentes na narrativa envolvendo os Super-heróis. Com isso buscou-se dividir essas diferenças em Eras, ou seja, em períodos de tempo que apresentaram diferenças nas abordagens, caracterizações e motivações destes gigantes ficcionais. São poucos os autores que conseguiram traduzir de forma precisa para o público em geral os elementos de cada uma destas Eras, convencionalmente chamadas de Eras de Ouro, Prata, Bronze e Moderna. Alan Moore foi um destes autores. Supremo foi um personagem genérico criado por Rob Liefeld e Brian Murray em 1992 dentro da avalanche de personagens que nasceram dentro do ambiente mercantilista que marcou os anos 90 dentro da indústria dos quadrinhos, sobretudo a indústria de Super-heróis. A Revista Supreme teve 56 edições e Alan Moore assumiu no Nº 41, provando que não existem personagens ruins, mas sim escritores ruins. No tempo em que Moore passou escrevendo Supremo, ele simplesmente dividiu sua passagem em segmentos que puderam ser agrupados de maneira a representar cada Era dos Quadrinhos, nascendo assim as publicações Supremo a Era de Ouro, Prata, Bronze e Moderna (as duas primeiras alvos de matérias aqui no Blog), que aqui no Brasil foram publicadas pela Editora Devir.


O que me surpreendeu nas duas primeiras abordagens (Era de Ouro e Era de Prata) de Alan Moore foi sua capacidade de destilar a essência destas duas Eras usando como epicentro a figura do Supremo. No caso da Era de Ouro a simplicidade das histórias são travestidas de objetivos secundários profundos, expostos por uma trama cheia de reviravoltas. No caso da Era de Prata, Moore traduz todo o Non-sense característico desta Era (fruto direto das restrições criativas impostas pelo Código de Ética dos Quadrinhos do governo americano) em aventuras profundas e originais entremeadas de recordações. Mas e a Era de Bronze? Recentemente concluí a leitura do 3º volume desta série abordando agora a Era de Bronze que teve seu início em 1973 (controvérsias à parte) com a história "A Noite em que Gwen Stacy Morreu" escrita por Gerry Conway e ilustrada por Gil Kane e John Romita. Embora a introdução de conteúdo mais profundo e atual já estivesse sendo introduzido nas HQs desde 1970, como por exemplo o arco de histórias produzidas por Denny O´Neil (roteiro) e Neil Adams (arte) envolvendo o Arqueiro Verde e o Lanterna Verde e a história de Stan Lee e Gil Kane de 1971 em que o Homem-Aranha precisa lidar com um amigo envolvido com o vício em drogas, foi mesmo com a morte de Gwen Stacy que a maturidade chegava aos quadrinhos de Super-heróis.


Em Supremo - A Era de Bronze, Moore faz a passagem da Era de maior inocência para uma Era em que os atos dos Super-heróis possuem consequências. O encadernado compila as edições de Supreme 53 à 56 e Supreme - The Return 1 de setembro de 1997 à maio de 1999. No volume encontramos histórias envolvendo dimensões paralelas, viagem no tempo, uma aventura em 3 partes envolvendo a amada de Supremo, Juddy Jordan (nossa Lois Lane) e sua morte, e uma sequencia eletrizante de uma batalha entre o Supremo e seus inimigos que fugiram da sua prisão permanente no Inferno de Espelhos (algo como a Dimensão Fantasma do Superman). O interessante é notar as profundas e filosóficas questões que Alan Moore coloca atrás do texto, ou seja, um subtexto em que temas como o sentido da vida, dimensões paralelas, amor, crítica social entre outros são inseridos. A sequencia aliás em que o Presidente Americano à época, Bill Clinton, participa da história, ao lado de sua esposa Hilary Clinton, é absolutamente genial. Moore expõe sua crítica sem deixar espaço para qualquer retaliação.


Obviamente o leitor de Supremo perceberá que no fundo ele é o nosso Superman, porém com a liberdade de participar de aventuras que a DC dificilmente deixaria. Por isso o fã deve entender que o personagem é uma grande homenagem ao Superman e à toda mitologia de quadrinhos de Super-heróis. Um outro ponto extremamente interessante, e que gostaria de ressaltar, é a existência de "ganchos" ao longo de toda história. Moore constrói uma colcha de retalhos que, tal qual um quebra-cabeças, as peças vão se encaixando. Sinais muito discretos acerca de determinados aspectos da histórias vão sendo espalhados e, mesmo o leitor mais experiente, se surpreende que determinado acontecimento esteja ligado ao que ele leu há várias edições atrás. Genial! Vi Alan Moore usar de expediente semelhante em outra série dele, Distrito Top 10, outra obra que você precisa conhecer e que foi lançada aqui no Brasil já há algum tempo pela Editora Devir.


Quando li os volume anteriores (Supremo - A Era de Ouro e Supremo - A Era de Prata) foi interessante notar as coisas nas quais Alan Moore acredita. Sim... para o leitor atento é possível depreender as crenças do escritor a partir do enredo. Vida após a morte, concepções acerca da humanidade, sentido da vida... Tudo isso está implícito nas aventuras do Supremo e é tudo muito profundo. Caso você leia de forma desatenta tudo passará a funcionar apenas como uma interessante aventura qualquer. Nada muito diferente do que já foi feito, mas no substrato das falas e roteiro há muitas mensagens que eu, particularmente, compartilho. A despeito de todo misticismo envolvendo Alan Moore, eu vejo a vida, o tempo, a mortalidade e a eternidade de uma forma bem parecida como a que ele vê. Por isso, minha sugestão é que caso você queira conhecer este material, é importante que você o leia a partir de Supremo - A Era de Ouro (1º volume), pois há questões neste 1º volume que se estendem ao longo dos demais como ondas em um lago após uma pedra ser ali atirada.


E antes que você pergunte se a arte interna é do Alex Ross eu já que respondo que não. Alex Ross fez diversas artes conceituais do personagem Supremo, como a que abre esta matéria e os esboços logo abaixo. No entanto, a arte interna é de diversos desenhistas (muito bons aliás) tais como, Chris Sprouse, J. Morrigan, Rick Veitch e Gil Kane. Para encerrar deixo abaixo uma arte representando A CIDADELA, a cidade voadora e morada do Supremo. Um local semelhante à Fortaleza da Solidão do Superman, porém que permanece suspensa nos céus. Ao longo de toda a participação de Moore junto ao personagem, A CIDADELA será muito importante e tão, ou mais, fascinante que a Fortaleza da Solidão do Homem de Aço da DC.


Bem amigos, espero que conheçam O SUPREMO de Alan Moore e percebam a grande homenagem ali presente aos Quadrinhos de Super-heróis. Grande abraço!

terça-feira, 15 de janeiro de 2019

Cinco Vermelhos - Tragédia, Poesia e Uma Aula de Arte


É possível que nos envolvamos em um jornada e acabemos por ser tragados pelo horizonte de eventos de nossa obsessão à ponto de atingirmos um ponto de "não retorno"? Sim... É possível. Para o bem ou para o mal temos uma capacidade de nos entregarmos apaixonadamente a determinado assunto, pessoa ou problema à ponto de sermos tragados por ele. Se o problema em questão envolver raiva e vingança é possível que nos transformemos até naquilo contra o qual lutamos. Esta aliás era a grande preocupação de Martin Luher King, ou seja, não se transformar em seu próprio algoz no processo de combatê-lo. Cinco Vermelhos é uma HQ autoral da artista brasileira Talessa Kuguimiya. Dona de um talento raro para converter desenhos em sentimentos profundos, Talessa nos entrega uma obra de violência, obsessão, perda, dor e acima de tudo busca de significados. Cinco Vermelhos esteve na plataforma de financiamento coletivo em 2018 e foi lançada recentemente.


À semelhança de outras obras da autora, Cinco Vermelhos transcende a barreira impressa e se complementa no meio digital. Ao longo da obra o leitor encontra QRs Codes (códigos de barras bidimensionais por meio dos quais pode-se acessar conteúdos extras complementares à obra). Para isso basta ter no celular um aplicativo leitor de QRs Codes que você será direcionado aos vídeos complementares. A HQ pode ser lida sem a necessidade de se visitar os vídeos, mas caso o leitor opte por isso, estará perdendo um conteúdo profundo em música e imagem. Talessa é formada em Animação 2D e 3D e aplica nos vídeos animados toda a poesia que transborda das páginas impressas. Uma das grandes "cerejas do bolo" são as músicas que acompanham os vídeos. Compostas pela violonista e compositora Karla Dallmann as faixas traduzem em sons todo lirismo da obra, criando momentos perenes e eternos em forma de pequenos curtas animados.


A parceria entre Talessa e Karla já vem de outras obras, por exemplo Minski, uma pequena menina criada acidentalmente por uma bruxa da floresta. Os títulos da Minski (2 até o momento) valem, aliás uma matéria exclusiva. Para 2019 teremos a parceria se repetindo na próxima HQ de Talessa, Sobre Trilhos. Mas e Cinco Vermelhos? Do que se trata? Para elaboração da obra a autora mergulhou fundo em suas origens, indo buscar na figura histórica do Samurai inspiração. A história se passa dentro da Era do Xogunato, sistema de governo predominante no Japão de 1192 a 1867 que se baseava na autoridade de um líder militar (Xógum). Muitos Samurais não aceitaram se submeter à liderança destes líderes, tornando-se proscritos e caçados. Este é o pano de fundo para a história da pequena Haya.


Vítima em sua infância de um ato extremo de violência ela trilhará uma jornada de obsessão em meio ao Japão dominado pelo Xogunato. Para mim, mais importante que o fim da jornada de Haya, foi o caminho que ela trilhou. Um caminho que nos faz pensar nas coisas com as quais nos deparamos e que, cegos pelas nossas próprias incoerências, acabamos por não perceber. Talessa também buscou inspiração no teatro Kabuki japonês. Como explicado nos próprios extras da obra, o Kabuki possui alguns temas recorrentes como formas de expressão, a saber: os temas históricos, cotidianos e sobrenaturais. Cinco Vermelhos se estrutura dentro destes 3 eixos narrativos, e Haya entrará em contato com estas 3 faces do maravilhoso Japão. Há uma aura mágica que transborda da história e, se soubessémos vibrar internamente na mesma frequência da obra poderíamos até tocar esta outra realidade.


Assim como nas peças Kabuki, que se estruturam em Cinco Atos (1º - Introdução dos Personagens e Trama; 2º, 3º e 4º - desenvolvimento; e 5º ou Ato Final - Conclusão) assim também ocorre com Cinco Vermelhos. Meu conhecimento acerca da narrativa gráfica japonesa (os Mangás) é mínima. Influenciado talvez pela invasão de animações japonesas nos anos 90, nunca tive muita vontade de conhecer esta expressão de arte. Espero agora reparar este erro a partir daqui com esta ótima introdução ao gênero.


Bem amigos, aqui vai outra obra que seguramente será um dos meus destaques para 2019. Um grande abraço à todos!


- Cinco Vermelhos -
Making of

segunda-feira, 7 de janeiro de 2019

O Que Aconteceu com o Capitão Stone? Vol. 01 - Inteligente e Original!


O ano de 2019 começou com chave de ouro para mim! O Que Aconteceu com o Capitão Stone? - Vol. 01, HQ lançada no 2º semestre de 2018 pelo selo Prime Edition da Editora Mythos me surpreendeu de uma forma incrivelmente positiva. Misto de homenagem e reflexão sobre o mito do super-herói, a HQ mistura temas altamente relevantes para nós hoje ao mesmo tempo que resgata narrativas usadas anteriormente em HQs de sucesso (Ex.: Batman - O Cavaleiro das Trevas de Frank Miller). Liam Sharp e Christine McCormack é o casal (na vida real inclusive) por trás da obra. Sharp é discípulo de Bill Sienkiewicz, e o leitor logo reconhecerá isso em algumas páginas que emulam (sem ser um cópia) HQs de Sienkiewicz, como Demolidor - Amor e Guerra e Elektra Assassina. Sharp e McCormack são originais partindo de conceitos e marcos já estabelecidos nos quadrinhos, por isso não soam presunçosos, ao mesmo tempo que conseguem ser originais.


Como é comum aqui no Blog, não darei SPOILER sobre a história, mas sim seu contexto geral. A obra se passa em nossa Terra, e eventos, personalidades e marcos culturais importantes são referendados na história, como por exemplo A Guerra do Golfo, Saddam Husseim, Arnold Schwarzenegger, Al Paccino e seu Scarface, Led Zepelin, o Filme Conan... ou seja, o leitor reconhece e se familiariza rapidamente com o mundo onde se passa a história. Embora a linha narrativa principal se passe em nossos dias, a base da história encontra-se nos anos 90. Foi nessa época que o Capitão Stone surgiu como um líder heroico apolítico, apartidário, engajado em causas humanitárias e libertárias. Seu sucesso nos anos 90 fez com que ele conseguisse criar sua própria tropa, "A Tropa Stone". Homens que, sob a liderança do Capitão, formavam uma força tarefa ágil, poderosa e cirúrgica em suas intervenções ao redor do Globo.


Alguns eventos no final dos anos 90, no entanto levaram o Capitão e sua Tropa ao descrédito, culminando com a revelação da identidade secreta do herói em um Talk-Show. Este 1º vol. já começa com tudo isso estabelecido, sendo o Capitão uma personalidade pertencente ao passado pop da América, tal qual um William Shatner e seu Capitão Kirk da série clássica Star Trek é para nós. Tudo isso é explicado logo no início da história por uma ex-modelo, agora reclusa, chamada Charlotte Chance. Os autores Liam e Christine conseguem deixar uma aura de nostalgia ao redor do Capitão Stone, que pouco aparece no início (e até ao longo) da história. Isso traz para todos nós, fãs dos personagens icônicos dos quadrinhos,  um reconhecimento quase instantâneo pela figura do Capitão. Que fã de quadrinhos não viveu (ou vive) a nostalgia de ver as melhores histórias de seu personagem preferido confinadas ao passado? É como se víssemos nosso herói esquecido na figura do Capitão Stone.

Charlotte Chance - A Mascote

Cada nova página da obra nos descortina uma faceta ou proeza do Capitão Stone, fortalecendo nosso vínculo com ele, ao ponto do mito penetrar em nossa mente e começarmos a enxergar o cara como sendo realmente um mito. Em meio às incríveis referências a respeito de política e cultura pop vamos nos reconhecendo dentro do universo da história, fortalecendo a impressão que vivemos realmente no mesmo mundo da obra. Tudo poderia ficar dentro desta perspectiva, só que não... Liam e Christine adicionam à história uma pitada de Teoria Quântica, ou seja, o que há de mais recente a respeito da física de partículas parece estar ligado ao sumiço do Capitão Stone. É com esse gancho que o volume se encerra.


A arte de Liam Sharp é outro capítulo à parte dentro dos méritos da obra. Embora o desenhista seja discípulo de Sienkiewicz, Liam possui seu DNA artístico próprio. De minha parte tanto a arte quanto a insólita história fazem um par perfeito. Alguns sentimentos como raiva, desejo, afeto são potencializados pela arte, de maneira que as proporções dos personagens em relação ao cenário são ditadas pelos sentimentos, e não pela simples relação de proporção real. Lembro de Sienkiewicz usar muito este expediente em Demolidor - Guerra e Paz. A edição da Mythos traz um grande número de extras. Em geral eu tenho o "pé atrás" com um número grande de extras. Já percebi que, às vezes,  determinadas editoras colocam muitos extras pouco significativos para alcançar um numero maior de páginas e então alçar o preço da edição à outros patamares. Apesar do grande número de extras nesta edição da Mythos, eu gostei de todos porque trabalham no sentido de expandir o Universo do Capitão Stone. Isso quer dizer que determinados mistérios sobre quem este herói realmente é, estão escondidos nos extras.





Espero que O Que Aconteceu com o Capitão Stone? - Vol. 01 alcance o êxito comercial necessário para que a Mythos lance sua continuação. A obra mostra o vigor da HQ autoral e inteligente. Recomendo!!
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