Há 33 anos nossa família estava em festa, pois chegava para nós um presente. Minha irmã (Michele) nascia e vinha nos alegrar com seu jeito peculiar. Eu tinha 6 anos, e como toda criança, muitas dúvidas pairavam em minha cabeça a respeito da chegada daquela nova integrante em um ambiente que até então eu dividia apenas com minha outra irmã mais velha. Até aquele momento eu detinha o posto de filho caçula e, embora eu não soubesse expressar o que isso significava em virtude de minha tenra idade, já era capaz de perceber que havia alguns melindres em relação à minha pequena pessoa que me deixava com um certo destaque entre meus pais. Comecei a perceber, mesmo antes da chegada da Michele que algo diferente começava a se processar nos ares de minha casa. Lembro-me, por exemplo, de uma ida com minha mãe e minha tia no Armarinhos Paulista e na Gurilândia em Londrina para comprar algumas coisas para o tal enxoval. Naquele época não era como hoje, o sexo da criança não era revelado aos pais de forma tão fácil. Acho que só os ricos tinham essa preciosa informação, de maneira que eu sabia que alguém viria, mas sua identidade estava envolta em mistérios. Ali, com minha mãe e minha tia percebi que algo começava a ameaçar meu pequeno reino. Ficamos a tarde inteira entrando e saindo dessas duas lojas e percebi que alguém que exigia tamanha atenção dessas minhas duas queridas figuras (mãe e tia) deveria ser alguém que viria para "botar pra quebrar". "Não é muita dedicação para alguém que nem chegou ainda, hein?!", pensava eu... "Pois eu nem me importo tanto com isso, viu?!", discorria eu com meus pequenos botões. Na época meu pai passava dias e dias fora a trabalho. Um trabalho que iria, futuramente, mudar nossas vidas. Hoje imagino minha mãe sozinha em nossa casa (perto do Com-Tour em Londrina), com duas crianças pequenas (eu e minha irmã), sozinha e com duas esperas, uma pelo meu pai e outra pela querida Michele.
Bom... o grande dia chegou. Não entendi bem as coisas e guardo pouca lembrança desse dia. Lembro-me que minha mãe de repente havia sumido!... E minha avó veio ficar conosco!! Não me lembro de ficar preocupado porque a presença da vovó sempre foi algo pacificador entre a gente. Só sei que como em um passe de mágica minha mãe apareceu uma manhã lá em casa segurando um pacotinho amarelo envolto em um cobertorzinho também amarelo. Devo lembrar novamente que, como as mães não conheciam o sexo do bebê naquela época, o amarelo sempre era uma cor certeira! Mas voltando... Eis que minha mãe aparece com aquele pacotinho. Sua feição (de minha mãe) era de cansaço misturado com alegria. Logo que vi seu rosto já comecei a me alegrar... Minha próxima lembrança desse primeiro encontro foi de vislumbrar duas pequenas estruturas que logo identifiquei como sendo dois pequenos pezinhos envoltos por um mijãozinho amarelo. Minha mãe, raciocinando rápido, percebeu meu interesse e abaixou-se um pouco para que eu visse quem era nossa nova integrante na família. As lembranças das imagens são antigas, porém os sentimentos que dali brotaram não, pois sempre estiveram comigo a partir dali. E tão fortes eles são que permitem me lembrar com muita nitidez da única frase que pude dizer para minha mãe diante daquele rostinho: "Ainda bem que ela é nossa, né mãe...!". Foi algo muito espontâneo, tanto que me senti muito adulto tendo falado aquilo, pois literalmente não me sentia ainda capaz de verbalizar sentimentos daquela ordem.
Minha irmã havia chegado!! Isso que era importante!! Michele tem sido para mim a mesma irmã daquele dia. Sensível, amorosa e amiga. Hoje ela faz aniversário... E gostaria de repetir aqui... do fundo do coração, novamente o que tão espontaneamente disse aquele dia com seis anos de idade: "Ainda bem que ela é nossa, né mãe...!!"