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sexta-feira, 30 de julho de 2010

Dia de Festa

Há 33 anos nossa família estava em festa, pois chegava para nós um presente. Minha irmã (Michele) nascia e vinha nos alegrar com seu jeito peculiar. Eu tinha 6 anos, e como toda criança, muitas dúvidas pairavam em minha cabeça a respeito da chegada daquela nova integrante em um ambiente que até então eu dividia apenas com minha outra irmã mais velha. Até aquele momento eu detinha o posto de filho caçula e, embora eu não soubesse expressar o que isso significava em virtude de minha tenra idade, já era capaz de perceber que havia alguns melindres em relação à minha pequena pessoa que me deixava com um certo destaque entre meus pais. Comecei a perceber, mesmo antes da chegada da Michele que algo diferente começava a se processar nos ares de minha casa. Lembro-me, por exemplo, de uma ida com minha mãe e minha tia no Armarinhos Paulista e na Gurilândia em Londrina para comprar algumas coisas para o tal enxoval. Naquele época não era como hoje, o sexo da criança não era revelado aos pais de forma tão fácil. Acho que só os ricos tinham essa preciosa informação, de maneira que eu sabia que alguém viria, mas sua identidade estava envolta em mistérios. Ali, com minha mãe e minha tia percebi que algo começava a ameaçar meu pequeno reino. Ficamos a tarde inteira entrando e saindo dessas duas lojas e percebi que alguém que exigia tamanha atenção dessas minhas duas queridas figuras (mãe e tia) deveria ser alguém que viria para "botar pra quebrar". "Não é muita dedicação para alguém que nem chegou ainda, hein?!", pensava eu... "Pois eu nem me importo tanto com isso, viu?!", discorria eu com meus pequenos botões. Na época meu pai passava dias e dias fora  a trabalho. Um trabalho que iria, futuramente, mudar nossas vidas. Hoje imagino minha mãe sozinha em nossa casa (perto do Com-Tour em Londrina), com duas crianças pequenas (eu e minha irmã), sozinha e com duas esperas, uma pelo meu pai e outra pela querida Michele.

Bom... o grande dia chegou. Não entendi bem as coisas e guardo pouca lembrança desse dia. Lembro-me  que minha mãe de repente havia sumido!... E minha avó veio ficar conosco!! Não me lembro de ficar preocupado porque a presença da vovó sempre foi algo pacificador entre a gente. Só sei que como em um passe de mágica minha mãe apareceu uma manhã lá em casa segurando um pacotinho amarelo envolto em um cobertorzinho também amarelo. Devo lembrar novamente que, como as mães não conheciam o sexo do bebê naquela época, o amarelo sempre era uma cor certeira! Mas voltando... Eis que minha mãe aparece com aquele pacotinho. Sua feição (de minha mãe) era de cansaço misturado com alegria. Logo que vi seu rosto já comecei a me alegrar... Minha próxima lembrança desse primeiro encontro foi de vislumbrar duas pequenas estruturas que logo identifiquei como sendo dois pequenos pezinhos envoltos por um mijãozinho amarelo. Minha mãe, raciocinando rápido, percebeu meu interesse e abaixou-se um pouco para que eu visse quem era nossa nova integrante na família. As lembranças das imagens são antigas, porém os sentimentos que dali brotaram não, pois sempre estiveram comigo a partir dali. E tão fortes eles são que permitem me lembrar com muita nitidez da única frase que pude dizer para minha mãe diante daquele rostinho: "Ainda bem que ela é nossa, né mãe...!". Foi algo muito espontâneo, tanto que me senti muito adulto tendo falado aquilo, pois literalmente não me sentia ainda capaz de verbalizar sentimentos daquela ordem.

Minha irmã havia chegado!! Isso que era importante!! Michele tem sido para mim a mesma irmã daquele dia. Sensível, amorosa e amiga. Hoje ela faz aniversário... E gostaria de repetir aqui... do fundo do coração, novamente o que tão espontaneamente disse aquele dia com seis anos de idade: "Ainda bem que ela é nossa, né mãe...!!"

segunda-feira, 26 de julho de 2010

Impasse Existencial

Desde há muito tenho um conflito que talvez esteja presente no coração de muitos também. Creio existir dentro de nós uma busca incessante por redenção e por expiação. Descobrir a forma e a maneira com que Deus nos ama, por meio da pessoa de Jesus, nos faz entender que não precisamos desenvolver atividades (ajudar os outros, nos engajar em campanhas voluntárias de auxílio àqueles mais desfavorecidos emocional e financeiramente) para sermos amados e redimidos. Na verdade gastei muito tempo de minha vida para entender que se fazemos tais coisas, não é para alcançarmos redenção ou perdão, mas sim porque já fomos redimidos e perdoados. Essa inversão de conceitos “ajudar os outros para ser perdoado” para “ajudar os outros porque fomos perdoados” é preciosa e foi uma dessas “invertidas” que tomei na vida, que me ajudou a entender, pelo menos um pouquinho, o que é “graça”, ou seja, favor imerecido da parte do Criador. No entanto, acho que assim como muitos, não consigo me livrar tão facilmente da sensação de estar devendo algo a Deus e aos outros. Essa sensação poderia ser vista por muitos como saudável e benigna, na medida em que nos move na direção do altruísmo e solidariedade. Porém, às vezes se torna sufocante e nos impede de viver plenamente, pois nos sentimos sempre “devedores”. Já experimentei a agradável sensação de ajudar os outros por amor, no entanto, isso não diminuiu essa sensação, ou seja, não foi suficiente, preciso fazer mais, mais, mais... Como se buscasse novamente a redenção pela minha alma e expiação para minhas faltas. Na verdade é como se houvesse um alto (muito alto mesmo) senso de justiça interno que não se satisfizesse com meros atos de amor e auxílio solidário, seja no ambiente eclesiástico seja fora dele. A partir desse impasse tentei ver minha profissão como forma de satisfazer esse meu senso interno de redenção. “Vou trabalhar, vou me esforçar ao máximo em meu ambiente de trabalho para assim trazer o reino de Deus para as pessoas”. Porém isso não adiantou muito porque percebi que envolvia dinheiro, ou seja, eu ganho para fazer aquilo, eu já ganho para dar o meu melhor. Pensamos (eu pelo menos pensava) que na medida em que o dinheiro entra na história parece-nos que, novamente, não pode ser satisfeita aquela vontade de gastar nossa vida com algo verdadeiro, algo que não seja simplesmente inútil (trabalhar-comer-dormir-divertir, trabalhar-comer-dormir-divertir...). Dessa forma permaneço em um xeque-mate espiritual e existencial. Um xeque-mate que dificulta até mesmo minha relação com Deus.
Recentemente, no entanto surgiu algo novo!! Disseram-me “Trabalhar, (qualquer tipo de trabalho, mesmo aquele visto como menos nobre) é ajudar Deus a trazer ordem ao caos!!”. Vivemos em um mundo de caos, primeiramente um caos interno, de emoções e feridas, às vezes caos familiar, profissional... Porém um dia Deus deu uma ordem para que tudo fosse benignamente ordenado. Essa ordem, subvertida pelo homem, deixou inacessível pra gente o mitológico JARDIM. Essa frase “Trabalhar é ajudar Deus a trazer ordem ao caos!!” começa a germinar em mim (lentamente é claro, como as duradouras mudanças exigem) uma nova forma de ver meu papel no mundo. De repente começa tomar forma a ideia de que tudo talvez seja sagrado, de que até mesmo o menor ato é sagrado. Pensei na criança que corre em direção ao pai com um desenho que acabou de fazer, um desenho cheio de imperfeições e rasuras, ou seja, um desenho feio mesmo para nossos padrões estéticos. Mas foi o melhor que aquela criança fez... Posso ver o orgulhoso olhar do pai e da mãe diante daquele desenho (vejo isso sempre nas minhas irmãs que já possuem filhos). Para elas é lindo! Talvez nossos atos imperfeitos, feitos em qualquer lugar, em qualquer ambiente (de trabalho ou não) sejam vistos dessa forma por Deus, em sua misericórdia. Talvez não consigamos mesmo satisfazer esse senso de justiça e de culpa que carregamos. Talvez não devêssemos querê-lo... Talvez devêssemos simplesmente tentar fazer o melhor, ainda que no final das contas não seja tão bom quanto pensamos ou quisemos que fosse. Talvez devêssemos nos concentrar em tentar transformar o caos a nossa volta novamente num jardim. Não ficará igual ao primeiro lá no Éden, mas talvez Deus saiba disso... (aí acho que é questão de acreditar Nele). No fim acho que Ele quer ser apenas um Pai mesmo... Esse pai que exemplifiquei acima.
 Para ser duradouro, aquilo que cai dentro da gente precisa de tempo. Precisa ser gestado, às vezes meses e meses, talvez anos, para dar algum fruto. Como a semente que cai na terra precisa do escuro e da umidade. Acho que tudo isso que entendi vai demorar um tempo para me libertar da necessidade contínua de redenção por meio de meus atos, mas quero muito que essa semente germine. Quero muito rega-la e deixa-la ali bem nutrida para que possa dar fruto, e que um dia, me traga a liberdade de simplesmente viver.

sábado, 24 de julho de 2010

O que nos faz viver...?

Galáxia SMM J2135-0102 - Espaço profundo (brilhos de estrelas em formação)
"O que me faz viver é tão intenso, que até me perco se explicar. O que me faz viver é tão profundo, mas, me vê no mundo, no singular.
 
O que me faz viver vai além da lógica, é maior do que a amplitude cósmica, que o meu pensar.
 
O que me faz viver, eu sei, é isto... de Jesus, o Cristo, o amar! - Sérgio Pimenta".

quarta-feira, 21 de julho de 2010

Preciosos Detalhes

Minha mãe fez esses pratos pra mim. São pratos "craquelados"! São bonitos e expressam amor, cuidado e sensibilidade. Como vocês podem ver, atualmente eles estão reinando soberanos em cima de minha estante de livros, irradiando sua beleza redonda pela sala de minha casa. Olhar para eles me faz lembrar de preguiçosas e cálidas tardes, do som do galinho cantando, de hortas com suas hortaliças anciosas para serem cuidadas e  molhadas, de jardins com flores ao sol dançando ao vento... Não tenho essas coisas aqui onde moro, mas tenho os belos pratos craquelados que me ajudam.

domingo, 18 de julho de 2010

Coisas Pequenas

Na casa de meus pais tem uma "Primavera". O vermelho de suas pequenas flores é muito vivo e bonito. Certa vez surpreendi essa pequena borboleta que, distraida e tranquilamente, estava desfrutando dessa amável amiga. Ela ficou pouco tempo ali, não quis ficar posando para mim. Logo voou e foi embora, queria privacidade.
As pequenas flores, no entanto, me pareceram mais orgulhosas de serem admiradas. Fiquei observando-as... Parecia que elas gostavam de serem despenteadas pelo vento... O sol não deixava por menos, fazia sua cor se acentuar ainda mais.
Quando fui embora, porém, não pude deixar de olhar para trás e perceber que seu brilho, sua cor e sua vivaz alegria não mudaram, não se alteraram em nada com minha ausência.... Fiquei pensando que enfim não estavam posando para mim, nem preocupadas comigo... Simplesmente existiam, independente de minha admiração, ficavam apenas contentes de brilhar em sua simplicidade... Simplesmente felizes de fazerem parte da criação.

sexta-feira, 16 de julho de 2010

John Merrick


Você sabe quem é esse homem acima? Seu nome era Joseph Merrick (1862 - 1890), que por um erro em um livro ficou conhecido como John Merrick. John nasceu com uma doença que até hoje intriga a medicina. Após sua morte diagnosticaram neurofibromatose, porém tal diagnóstico foi alterado nos anos 80 para Sindrome de Proteus, hoje novamente questionado. Conhecer sua história foi uma das maravilhosas coisas que  me aconteceram. A anomalia de John é descrita na esfera da Anatomia Humana como "Monstruosidade" (...anomalia tão acentuada de modo que deforma profundamente a construção do corpo do indivíduo, sendo em geral incompatível com a vida - Tortora G.J. & Grabowski S.R. - Fundamentos de Anatomia e Fisiologia, - Editora Artmed, 2006). Em minhas aulas de Anatomia Humana costumo usar seu exemplo. John foi abandonado pela mãe, cresceu sozinho nas ruas de Londres. Durante uma significativa parte de sua vida ele foi apresentado em espetáculos  em um circo como se fosse uma mistura de animal e ser-humano, onde foi muito maltratado. Porém um médico (Sir. Frederick Treves) certa vez o viu e se interessou pela sua anomalia. John foi comprado do circo por Frederick, e passou a viver no hospital. Grande foi a surpresa de Sir. Frederick ao perceber que John não apenas não era um animal, como falava, lia e conhecia partes da Bíblia de cor. John continuou a ser exibido, só que agora à comunidade médica, porém foi profundamente grato pela dignidade com a qual passou a ser tratado. "Minha vida é plena porque sei que sou amado. Eu descobri! Sem o senhor não poderia dizer isso - John Merrick à Sir. Frederick". A popularidade de John foi grande na Inglaterra do final do século 19. Ele gostava de poesia e flores. Em uma viagem que fez ao interior da Inglaterra colheu muitas flores selvagens. Seu desejo era ficar em um hospital para cegos, onde sua aparência não repugnaria as pessoas. Seu esqueleto encontra-se preservado até hoje e resta um pequeno museu sobre sua vida. John morreu aos 28 anos. Tentando imitar o comportamento de um ser humano normal para dormir, John causou um deslocamento acidental do pescoço, que não suportava o peso da cabeça. Conheci sua história em um filme de 1980 que gostaria que todos assistissem, "O Homem-Elefante" de David Lynch.

segunda-feira, 12 de julho de 2010

Carpe Diem

 
Ao longo de nossa vida a gente vai conhecendo coisas. Algumas vezes somos profundamente tocados por algo. Pode ser um livro, um quadro, um filme, um poema... O fato é que, às vezes, esse "algo" penetra fundo em nossa alma. Isso aconteceu comigo algumas vezes. Sabemos exatamente quando essas coisas/sentimentos entram em nossa vida. Quando acontecem entram em nosso ser produzindo ondas em nosso interior por muitos anos, tal qual uma pedra que cai num lago calmo, e vai produzindo ondas em todas as direções. Penso que algumas dessas coisas nos impactam tão profundamente porque estamos preparados para senti-la naquele momento. Uma delas aconteceu comigo quando estava na faculdade, na longínqua transição entre anos 80 e 90. "Sociedade dos Poetas Mortos" foi uma dessas epifanias; não foi a primeira, nem foi a última, mas hoje algo me fez lembrar dos sentimentos ali suscitados. Acho que foi assistindo à esse filme que algo começou a ser despertado dentro de mim, algo que até hoje não consigo descrever, mas que passa pelo assombro, pela perplexidade, pela fragilidade, pelo temor reverente diante da grandiosidade da existência. O filme é cheio de citações de Walt Whitman, poeta americano que viveu entre 1819 e 1892. Tenho até um livro dele, "Folha das Folhas de Relva". "A pé e de coração leve eu enveredo pela estrada aberta, saudável, livre, o mundo à minha frente, à minha frente o longo atalho pardo, levando-me aonde eu queira..." - Canto da Estrada Aberta (fragmentos), Walt Wihitman.

quinta-feira, 8 de julho de 2010

Filho do Hamas

Recentemente assisti à entrevista de Mosab Hassan Yousef, um jovem palestino de 32 anos autor do livro "Filho do Hamas". Sua fala me impressionou ao colocar em cheque sua crença. Mosab possui um relato de vida incrível (para falar o mínimo), sobretudo pela sua experiência com o cristianismo. Seu livro encheu-me de reflexões, espirituais, políticas e existenciais, dentre elas: 1 - realmente, como diz a Bíblia, "... o vento sopra onde quer"; 2 - a questão árabe-israelense possui profundas raízes e quaisquer tentativas de reconciliação deve ser feita em primeiro lugar com um profundo conhecimento desse tema e com grande coragem; 3 - como realmente vale a pena vivermos nossa vida? No fim são as pessoas que importam, não as ideologias. Mosab odiou, quase matou, foi preso, conheceu os porões das prisões israelenses, bem como as entranhas do seu serviço secreto (Shin Bet). Atuou como espião e esteve ligado ao alto escalão do movimento conhecido como Hamas. Increditavelmente porém, foi modificado na direção do perdão. É um jovem de extrema coragem que passo a admirar e reintera minha posição de que o conhecimento de Deus realmente é individual, não coletivo. Somente a caminhada que o é.

domingo, 4 de julho de 2010

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