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quinta-feira, 9 de setembro de 2021

Pílula Gráfica #8: Viajante de Cinza (2021)


A segunda metade dos anos 2010 viu diversas editoras especializadas em quadrinhos emergirem no cenário editorial brasileiro. Talvez um dos motivos principais para esta efervescente cena, foi o fato de que muitas publicações de fora do país de altíssimo nível eram (há décadas) negligenciadas pelas editoras tradicionais. Aproveitando esse nicho, editoras como Pipoca e Nanquim, Skript, Editora 85, Graphite Editora, Editora Figura, Editora Tundra, entre outras, ganhassem seu espaço. Dentre elas a editora Comix Zone tem feito um ótimo trabalho de curadoria junto à autores latino-americanos. Infelizmente eu demorei muito para conhecer esses autores. Comecei de forma incipiente conhecendo o trabalho do Argentino Héctor Oesterheld e, após esta primeira experiência fui literalmente cooptado pelo estilo de narrativa. Dessa leva temos chegando no Brasil o metafórico, onírico e profundo Viajante de Cinza, do argentino Carlos Trillo (1943-2011) e do uruguaio Alberto Breccia (1919-1993). Publicada originalmente entre 1978 e 1980 é difícil de acreditar que já há tanto tempo (ainda quando as Graphic Novels engatinhavam) Trillo e Breccia tenham atingido o nível visto nesta obra. Um nível em que a arte (Breccia), narrativa, argumento (Trillo) e originalidade se entrelaçam de forma precisa. Viajante de Cinza narra a vida do preso Cornelius Dark, trancafiado em uma cela e passando por inúmeros períodos em "solitária". A opção de Trillo não revelar exatamente o motivo da prisão de Cornelius, e nem há quanto tempo ele está preso, produz um efeito no leitor de distorção da realidade, de desconexão e perda da dimensão espacial, que se fecha ao redor do leitor tanto quanto se fecha ao redor de Cornelius. Esse clima criado pela narrativa de Trillo e arte de Breccia faz com que tudo fora da cela de Cornelius diminua, enquanto seu interior cresce. Para escapar da insanidade, ou talvez (justamente) por entrar nela, Cornelius passa a experimentar viagens mentais em que vivencia e participa de momentos do passado de outras pessoas. Sejam situações históricas ou cotidianas. A atmosfera onírica, melancólica e reflexiva impacta o leitor de uma forma profunda e inescapável. A arte de Breccia é camaleônica e se transforma de traços duros e marmóreos (na prisão) para traços etéreos e efêmeros durante os devaneios de Cornelius. Não há como não vislumbrar uma grande influência do "expressionismo alemão" como se pode, por exemplo, ver na imagem abaixo na história "Arles 1888". A edição de Viajante de Cinza da Comix Zone compila as histórias do personagem e constituem uma "pérola" da 9ª Arte que me impactou profundamente. Novamente outro lançamento que estará entre os melhores de 2021.






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