Finais de ano são encerramentos de ciclos. Momentos para olharmos para trás, agradecermos e celebrarmos destaques e conquistas. Vamos viajar agora por entre minhas melhores leituras de HQs de 2024. O objetivo será exaltar as "leituras" e não os lançamentos, até porque para nos propormos a falar de lançamentos minha demanda de leitura seria enorme frente à tantas excelentes obras que chegaram ao Brasil em 2024. A ordem das obras aqui expostas obedecem minha ordem de leitura.
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Júlia - Aventuras de uma Criminóloga - Nº 01 |
2024 foi, definitivamente, meu ano de descoberta desta série sobre a qual há muito tempo me chegavam elogios, mas que pela demanda de outras leituras eu postergava conhece-la. Estou falando de Júlia Kendall - Aventuras de uma Criminóloga. Por puro preconceito, eu associava a série à alguma memória de séries para público juvenil, daí meu desinteresse. Para me convencer a dar uma chance foi preciso receber muitas informações e elogios sobre a série, e perceber que seu autor era o mesmo do grande e excepcional Ken Parker. Só lamento ter esperado tanto para ler Júlia Kendall. No Brasil temos uma publicação relativamente farta da personagem e não foi difícil conseguir os números. Fiquei realmente surpreso com a qualidade do material, com as referências e com todo o universo coeso e crível de Júlia. Não dá para separar uma edição específica, por isso meu destaque vai para todas que li esse ano.
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Júlia - Aventuras de uma Criminóloga - Nº 02 |
Se no número 1 de Júlia, somos apresentados ao universo da personagem de forma sutil, lá também conhecemos aquela que viria a ser sua nêmese, a assassina Myrna. Uma garota que embora venha de um relacionamento difícil com o pai, é uma pessoa sem quaisquer escrúpulos para matar. É no número 2 que vemos se desenvolver uma atração de Myrna pela mente astuta e sagaz de Júlia. O leitor percebe então o qual real, acadêmica e crível é a narrativa de Giancarlo Berardi acerca da mente criminosa dentro das quais a criminóloga mergulha.
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Júlia - Aventuras de uma Criminóloga - Nº 03 |
É no número 3 que o primeiro arco de confronto entre Júlia e Myrna se conclui. Estratégia, violência e muito suspense demonstram ao leitor o tipo de obra que é Júlia. Berardi se esmerou na construção da personagem, frequentando cursos e lendo muito acerca de criminologia. Como resultado Júlia se constitui em um palco sobre o qual a aparente fragilidade da personagem (inspirada fisicamente na atriz Audrey Hupburn) se contrasta com a maldade, violência e visão doentia de mundo de muitos criminosos.
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Júlia - Aventuras de uma Criminóloga - Nº 04 |
Os personagens que orbitam a vida da criminóloga, que também é professora na Universidade local na cidade de Garden City, são muito interessantes. E um provável interesse romântico se insinua entre o irascível e cuidadoso Tenente Webb (na capa acima em 2ª plano) na 4ª edição. Longe de ser expressão da masculinidade e beleza Hollywoodianas, Webb ganha o leitor pela personalidade forte e constantes confrontos com Júlia. Outro personagem, o Sargento Irving, é destaque também. Obeso, alto e com um profundo instinto protetor junto à Júlia, Irving é um excelente policial. Sempre pronto para agir frente às situações mais perigosas. Se você não conhece o universo de Júlia, ou sempre postergou a leitura, não perca mais tempo.
A
Sergio Bonelli Editore foi a minha grande descoberta desta última década e, como consequência, vários títulos aqui são desta gigante italiana.
Morgan Lost é um personagem que:
a) pela sua proposta
noir;
b) seu universo no estilo
Art Deco;
c) e história de crimes consistentes, invadiu forte minha estante. Solitário, com sutis crises existenciais, atormentado pelos fantasmas dos assassinos que já matou,
Morgan Lost vale muito a pena e sai no Brasil pela
Editora 85.
Jeff Lemire tem deixado sua marca na 9ª Arte já há algum tempo.
O Soldador Subaquático,
Black Hammer,
Gideon Falls entre outros já apontaram para o estilo, sensibilidade e imaginação para o fantástico do autor.
Nada a Perder estava na minha pilha há algum tempo e quando o peguei para ler eu não estava com tantas expectativas, considerando que um leitor de longa data sempre sabe que é difícil para um autor manter sua narrativa significativa ao longo de várias obras. Quando lemos
Nada a Perder fica claro que
Lemire não pretendia mesmo torna-lo um clássico (pelo menos foi minha percepção), uma vez que a obra se re-ssignifica e cresce justamente por trazer apenas a vida de um sujeito comum (nada mais). Mas que dentro de sua vida comum, seus sonhos desfeitos, erros cometidos e relacionamentos destruídos é que a história cresce. A arte meio "quebrada" de
Lemire dá assimila muito bem personagens "quebrados" por dentro. Canadense,
Lemire sabe trabalhar bem as paisagens geladas, melancólicas e aparentemente sem vida do norte do Canadá onde se passa a história.
Ao lembrar que de Marvel e DC também se vive a vida de um leitor, trago o ótimo Capitão América por Jim Steranko. O encadernado é um recorte de uma determinada fase do Sentinela da Liberdade, mais especificamente Captain America n° 110, 111, 112 e 113, todas de 1969. Uma fase em que seu descongelamento e reinserção à sociedade moderna da década de 60 ainda estava ocorrendo. Com isso, sua angústia pelo passado perdido, saudade de pessoas queridas (principalmente seu parceiro Buck Barnes) ainda o assolava de forma esmagadora. Um leitor desavisado que for ler o encadernado pode ficar com a impressão de que a história sai de um determinado lugar e vai para lugar nenhum. Isso não está totalmente errado porque trata-se apenas do recorte de uma fase, entretanto, este pequeno recorte cresce incrivelmente na arte de Steranko, artista rebelde, que soube inserir, na sua passagem pelos quadrinhos, colagens e inovações marcantes. O resultado é que este encadernado se torna uma pequena pérola representativa da arte do artista.
Desde 2019 (data de seu lançamento), ouço falar sobre Roseira, Medalha, Engenho e Outras Histórias de Jefferson Costa. Muitos elogios e críticas positivas... Acontece que quando finalmente decidi ler a obra confesso que não foi fácil lê-la. A obra possui uma narrativa truncada (propositalmente (creio eu)), com o passado se misturando com o futuro sem grandes explicações. Um painel narrativo construído sem compromisso com a linearidade ou entendimento do leitor. Sabemos que há muito significado em cada quadrinho... mas ao mesmo tempo essa significância nos escapa... deixando tudo ao mesmo tempo fluido e profundo (se é que dá para colocar estas duas palavras quase antônimas na mesma frase). O fato é que quando terminei de ler tive uma sensação estranha, sabia que tinha gostado, mas ao mesmo tempo a obra deixa um desconforto. Talvez por representar bem o próprio ônus de se viver. Uma obra que decididamente eu precisaria reler.
A Coleção
Epic da Marvel iniciou há não muito tempo nos mesmos moldes da sua proposta nos EUA. Momentos épicos de determinado personagem ou grupo. Neste volume,
Liberdade, traz uma fase do
Surfista Prateado que sempre quis ler: a fase da sua libertação da barreira de
Galactus que o mantinha preso à Terra desde sua rebelião contra o Devorador de Mundos que ocorreu em
Fantastic Four Nº 50 de 1966. As inúmeras tentativas de se libertar da barreira sempre foram angustiantes para todos que cresceram lendo o universo Marvel. A liberdade definitiva, entretanto, só ocorreu em
Silver Surfer - vol. 01 - Nº 01 de 1987. Embora tenham se passado 21 anos entre 1966 e 1987, a verdade é que no tempo dos quadrinhos
Norrin Rad ficou preso à Terra por 15 anos (segundo pesquisas que consegui fazer - se alguém tiver outra informação avise nos comentários). Neste encadernado a fase é predominantemente escrita por
Steve Englehart e desenhada por
Marshall Rogers. O arco principal do encadernado trabalha não apenas a liberdade do personagem da barreira de
Galactus, mas traz também finalmente o desfecho do romance platônico entre
Norrin e
Shalla-Bal. Vemos importantes mudanças na personalidade do Surfista, que passa de sua tradicional melancolia e tristeza para sentimentos mais vinculados à decepções e maturidade humana, dentre eles: raiva, ironia, cinismo... Como se finalmente
Norrin saísse da adolescência emocional e migrasse agora para as várias matizes das emoções humanas. Nesse contexto,
Mantis (a Madona Celestial naquela época) têm importante papel ao conduzir o ex-arauto de
Galactus aos labirintos de sentimentos humanos. Como pano de fundo presenciamos ainda uma nova edição da
Guerra Kree-Skrull e os planos cósmicos dos
Anciões.
Esses foram minhas leituras de destaque amigos. E as suas? O que você leu em 2024 no mundo quadrinístico e gostaria de destacar?
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