Em contra partida ao "Imortal", Jorge Luis Borges escreve sobre Benjamín Otálora. Sua história mostra-nos a inutilidade da mortalidade. Benjamín foi cria dos pampas argentinos, uruguaios e brasileiros. Era um caudilho forte, bem apessoado, indomável. Morreu como viveu: jovem e à bala. Sua sede de ascender entre os seus lhe condena, pois mais forte que viver era seu desejo de ser. Otálora tinha 19 anos quando se envolve com os peões de Azevedo Bandeira, fazendeiro e líder político poderoso. Ele tenta com o tempo se rebelar e tomar o lugar de Azevedo (seu patrão na fazenda). Para isso incita seus peões, dorme com sua mulher e por fim se vê traído pelo capataz Ulpiano Suárez. Antes de Ulpiano abrir fogo, Otálora percebe que fora traído desde o início, haviam lhe permitido o amor, o mando e o triunfo junto aos colegas. Isso porque ele já estava morto há muito para Azevedo.
O paralelo, creio eu, entre as histórias de Marco Flamínio Rufo (em "O Imortal") e Benjamín Otálora (em "O Morto"), é que está imposto ao ser humano uma imutável inutilidade na imortalidade e na mortalidade. Esse terrível impasse nos projeta em direção ao medo da eternidade. Os espaços são por demais gigantescos no universo, por demais profundos. Sua contemplação (como dizia Blaise Pascal) nos enche de perplexidade e temor. Assim como todo mundo, sempre tive medo de encarar tamanho mistério, por isso nos envolvemos com nossa realidade e procuramos não pensar na existência.
Há muito tempo passei à crer em um relacionamento pessoal com Deus. Um encontro que se processa, como dizia C.S. Lewis, como um encontro entre caça e caçador. Um encontro onde, na verdade, a caça somos nós, e Ele "O Caçador", pois percebe que não conseguimos sozinhos nos deparar com tamanha imensidão. C.S. Lewis chega a nos propor, em um de seus livros, uma pergunta: "O que aconteceria se você, em seu quarto, ouvisse passos no corredor chegando cada vez mais perto de sua porta? Sua casa estava trancada. Você não sabe quem é. De repente a maçaneta começa à girar. E se fosse Ele, querendo encontrar você?". Lewis, como todo bom e velho ateu, se sentiu caçado e importunado por Deus. Que não sossegou enquanto não Se fez achar. Como eu dizia acima, os espaços são grandes, vazios e esmagadores demais para ficarmos sem Sua presença. A única coisa que para mim quebra a inutilidade, tão bem apresentada por Jorge Luis Borges, é saber que... nesse exato momento Ele nos caça.
Assim como Lewis diz, talvez não adiante fugir. Ele nos achará, pois é caçador. Só nos resta ficarmos aqui... esperando a maçaneta da porta girar. É Ele que está abrindo...
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