Um dos livros mais estranhos que já li chegou às minhas mãos quando tinha uns 13 anos. O Espelho no Espelho - Um Labirinto (Der Spiegel im Spiegel - ein Labyrinth - em seu título original em alemão) foi escrito por Michael Ende, escritor alemão da nova geração. Filho de Edgar Ende (um dos mais importantes pintores surrealistas alemães), Michael nasceu na Bavária em 1929 e herdou do pai seu gosto pelas artes. O trabalho mais conhecido de M. Ende foi "A História Sem Fim" livro sobre um mundo mágico para o qual um garoto é transportado. A História Sem Fim virou filme na década de 80, trazendo luz à sua obra. Dono de uma narrativa cheia de simbologia, Michael Ende escreveu sobretudo para o público infantil: "Jim Knopf e Lucas o Maquinista", "Manu, a menina que sabia ouvir", "Dagoberto Dobradura", "Momo e o Senhor do Tempo", "O Teatro de Sombras de Ofélia" (esse último com um significado especial para mim).
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Edição em Português |
O Espelho no Espelho é na verdade um livro cheio dos mais estranhos e surreais contos que já passaram por meus olhos. Por meio de diversos mundos Ende trabalha um verdadeiro universo de alegorias. O primeiro conto do livro é talvez um dos meus preferidos. "A História de Hor": Hor é um rapaz que vive no interior de um castelo ou mansão (não se sabe ao certo). Ele tampouco entende o que faz ali uma vez que já nem se lembra à quanto tempo está vagando por seus intermináveis quartos e salas. O motivo real de sua estada ali já se perdeu em sua memória. As janelas e portas dos cômodos sempre desembocam em outros cômodos. O estranho é que toda vez que ele deixa um local, os móveis, a decoração, um sofá, uma esrivaninha se rearranjam um pouco, mudando assim sua aparência (como se o lugar tivesse vida própria). Dessa forma os locais sempre parecem diferentes. Hor se alimenta das paredes do lugar, de maneira que ele só percebe que passou por um cômodo algum dia no passado porque nota um pedaço de parede carcomido, ou um montinho de excrementos já seco no cantinho do lugar. Só assim ele fica sabendo que um dia já passou por ali. Hor já se perguntou várias vezes quem ele é... Às vezes ele imagina estar sonhando, e logo acordará e entenderá tudo... Às vezes ele simplesmente imagina que a verdade é que ele está sendo sonhado por alguém que vive além daquele lugar. Sua vida é um eterno vagar por salas, salões e quartos...
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Edição Alemã |
Em outro conto M. Ende descreve dois homens caminhando em um deserto. Um altivo, impecável, trajando um terno sempre limpo, seu rosto sem qualquer expressão. Tal homem nunca se cansava ou transpirava, apesar de caminhar em um sol escaldante. Atrás desse homem caminha outro, menor, cansado, suado, escaldado pelo sol, lábios rachados, trajando uma roupa de noivo já carcomida pelo tampo. Sapatos furados, camisa para fora da calça. À cada três passos esse pequeno homem precisa puxar as calças para cima, pois já estão grandes demais para seu pequeno e mirrado corpo. Os dois caminham na direção de uma porta que se encontra no horizonte árido, mas que nunca chega. O pequeno e envelhecido noivo sempre pergunta quanto tempo falta e o impassível e impecável homem lhe diz que falta pouco. Após anos caminhando o primeiro homem tem até de carregar o velho noivo, pois ele já não podia caminhar. Certo dia ambos chegam à porta. Sozinha e sem nada ao redor a porta se abre e uma linda e esvoaçante noiva sai dali. O envelhecido noiva havia sido colocado à beira da porta pelo impecável primeiro homem. A noiva em seu afã de sair correndo nem percebeu aquele homem nanico e velho olhando para ela à beira da porta. A única coisa que ela fez foi perguntar ao impávido primeiro homem: "Onde... Onde por favor está meu querido noivo?". Ao que o homem sem expressão lhe respondeu: "Fique tranquila, ele está esperando você atrás daquela porta no horizonte oposto". Assim os dois seguiram seu caminho. O homem impecável caminhando sempre ao seu próprio ritmo e a alegre noiva saltitando à sua frente. Diante da cena o envelhecido noivo consegue se lembrar de algo semelhante que lhe aconteceu, quando ele mesmo saiu correndo há muito tempo para encontrar sua noiva, porém ele parece se lembrar de uma pequena velhinha à beira da porta quando ele mesmo mal podia esperar para encontrar sua querida noiva...
Somam-se à esses, outros diversos contos... Onde o tempo, o espaço e tudo o que ele contém gira ao nosso redor como um labirinto. De todos os livros de M. Ende "O Espelho no Espelho" talvez seja o mais inquietante. Sua obra, voltada sobretudo para crianças, são cheias de lugares mágicos, símbolos e significados. É assim que escrevia e é assim que Ende provavelmente queria ser lembrado. (Michael Ende - 1929 - 1995).
Amei essa postagem...
ResponderExcluirJá cliquei e comecei a ler o livro.
Abraços.
Olá, Marcelo!
ResponderExcluirNossa! Tudo parece um sonho/pesadelo, daqueles que não conseguimos despertar de jeito nenhum.
Eu já havia ficado interessado quando você comentou, agora sinto que preciso ler este livro. Rsrs
Abraço!
E aí Moisa!!
ExcluirLegal encontra-lo por aqui!!
Valeu pelo comentário! Caso realmente queira ler o livro eu empresto para você. Ok?
Um grande abraço!
Marcelo.
Marcelo, é sempre um prazer visitar o seu espaço.
ExcluirComo eu acabei "adquirindo" o livro, não será necessário me emprestar, mas aprecio muito sua oferta. Numa próxima oportunidade, gostaria de ver o livro, principalmente por se tratar de um sobrevivente ;-)
Forte Abraço.
Sempre legal ver seu comentário por aqui Moisa! Afinal acho que foi aqui que eu, você e o Márcio começamos nossa amizade!
ExcluirPode deixar que vou levar o livro para você dar uma olhada. Nisso você tem razão, ele é um sobrevivente mesmo!!
Apareça sempre!!
Grande Abraço!
Marcelo.
Marcelo, eu não li o livro, porem tem uma parte em que parece que ha varias pessoas em uma sala de aula, vc pode falar sobre?
ResponderExcluirse puder fala por email serei grata: nayaraclimab@hotmail.com
ExcluirOlá Nayara...
ExcluirVou mandar sim.
Abraço!
Marcelo.
Olá,
ResponderExcluirEste livro me chegou em mãos, quando eu ara ainda uma pré-adolescente, acho que tinha 12 anos, tão menina... Li e reli tantas vezes, caminhei por todas as instâncias destes sonhos, me afeiçoei aos personagens... O exemplar não era meu.Era de meu irmão mais velho, que nunca atendeu minhas súplicas de dá-lo a mim. Não o fazia, pois sabia a cumplicidade que existia entre nós (obra e leitora)... Hoje, mais de 25 anos depois, uma bela e linda amiga deu-me de presente... Olhei sem acreditar para o livro, o abracei, como a um velho e muito querido amigo, o qual ficou guardado em memória. Cheguei a duvidar se o livro realmente existira, ou se fora mesmo sonhado por mim... Quem seria Hor, se não um sonho meu... Quão agradecida estou... Quão feliz estou come este lindo e tão especial presente. Meu livro, amigo de tantas horas insones, dos conflitos de uma solitária menina, finalmente está comigo novamente... e agora é de verdade meu... Minha benfeitora escreveu em sua dedicatória: "Há livros que nunca devem se afastar de nossa estante...". Digo mais: os livros que realmente significaram em nossa vida, nunca devem se afastar de nosso coração...
Abraços,
Bruna
Que lindo e emocionante comentário Bruna! Fico feliz por você ter ganho este livro que lhe é tão especial!
ResponderExcluirVou começar a lê-lo agora. Espero que se torne tão especial pra mim quanto foi pra você.
Agradeço ao Marcelo pelo ótimo texto!
Abraço à todos!
Rodrigo