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segunda-feira, 27 de maio de 2019

N. - Uma Experiência Lovecraftiana


Depois de várias décadas Stephen King continua sendo um dos maiores nomes da literatura do século XX, por mais que a Academia tenha relutado em aceitar isso. Sua longeva e profícua carreira atestam uma das mentes mais inquietas da literatura. N. é uma adaptação de um conto de King presente no livro Ao Cair da Noite, publicado no Brasil pela Editora Suma das Letras. Nesta adaptação em quadrinhos o escritor Marc Guggenheim e o artista Alex Maleev assumem a difícil tarefa de colocarem seus nomes em um material que tem o selo de King. Verdadeiramente assustadora, a HQ foi lançada no Brasil pela DarkSide Books, uma editora que entendeu a paixão e exigência dos leitores do gênero suspense e terror e tem nos brindado com lançamentos cada vez mais excepcionais. Não apenas em função do conteúdo, mas também pelo acabamento gráfico e concepção artística das obras.


Impresso em um papel diferenciado, permitindo que a arte de Alex Maleev ganhasse conotações intimistas, a edição Brasileira é um primor em acabamento e experiência sensorial ao leitor. A começar pelo toque, cheiro e exuberância visual. Maleev conseguiu expressar os personagens com expressões corporais e faciais que literalmente transportam o leitor para o interior de cada um deles. O trabalho de adaptação de Guggenheim fez jus à ideia inicial de King, expandindo o que era apenas um conto, em uma história que se aprofunda no universo interno de cada um dos envolvidos.


Para mim, a especialidade de Stephen King sempre foi relatar universos pequenos e perdidos. Cidades pequenas (à princípio simples e sem atrativos), sítios, fazendas... Locais em que ninguém veria qualquer problema acontecendo. Porém, King sempre foi mestre em nos fazer mergulhar naquilo que está escondido debaixo dos "tapetes" sociais, relacionais e pessoais. Em N., temos algo parecido, um local perdido e que possivelmente nem consta no Google Maps. Este pequeno e isolado pedaço de terra é visitado sem nenhuma pretensão pelo economista e fotografo amador N. (do título). N. tem um hobby, tirar fotos de paisagens e estruturas da vida rural no entorno da pequena cidade na qual reside. E este é o começo da trama, N. fica interessado em uma pequena formação de pedras dispostas em círculos no local mas que, estranhamente, alterna entre 7 e 8 o número de pedras que compõe o círculo. Quando observado à olho nu são 7, quando observado pelas lentes de sua câmera são 8.


O assustador da história está no que não é revelado, ou seja, o objetivo milenar daquelas pedras e sobretudo o efeito perturbador e psíquico que passa a ter sobre N. Uma parte significativa da história gira em torno da lenta deterioração da psiquê de N., que em suas sessões de terapia tenta explicar ao seu psiquiatra as visões, manias, compulsões e distúrbios que vem apresentando. O leitor acaba por entender algumas coisas nas entrelinhas e é o preenchimento destas lacunas da história pela mente do leitor que  acaba por construir um painel assustador e profundo. Em suas obras, Stephen King  sempre sugeriu a imanência de certos lugares, ou seja, as emoções e sensações que certos locais guardam, e que nós, imersos em nossos universos tecnológicos e virtuais acabamos por não perceber. Mas dependendo do lugar, aquilo que está ali guardado começa a transbordar e vazar, chegando a invadir até mesmo as mentes mais urbanas e racionais.


Este "vazamento" começa ocorrer do local que N. encontra e atinge outras pessoas ao seu redor. Outras pessoas passam protagonizar a história e este é outro positivo da obra, ou seja, a centralidade da trama passa de uma pessoa para outra, o que dinamiza o drama e o expande. O termo "Lovecraftiano", muito em voga atualmente, pode ser muito bem aplicado em N. Sem dúvida nenhuma a origem da pedras e sua função são diretamente ligadas à um Universo inominável que existiria paralelo ao nosso. A influência de Lovecraft sobre King nesta história e sobre Guggenheim ao adapta-la é total. Se você é fã de Lovecraft deve ler esta obra. Não pude deixar de associar a história a existência de outros monumentos estranhos presentes no mundo como Stonehenge na Inglaterra.


A DarkSide Books está de parabéns por este lançamento, que estará entre minhas indicações de melhores HQs lidas em 2019.

Um grande abraço à todos!

sábado, 18 de maio de 2019

Miniatura Marvel Nº 60 - Super-Skrull

Miniatura Marvel Nº 60 - Super-Skrull

Escrever a respeito do Super-Skrull é escrever sobre os primórdios da Era de Prata na Marvel... No início da década de 60, quando Stan Lee ao lado de diversos outros gigantes da 9ª Arte lançavam as bases do que viria a ser a Marvel no futuro, raças alienígenas ainda não haviam consolidado seu papel dentro do Universo ficcional da Casa das Ideias. Iniciativas de trazer ETs para a Terra já haviam sido feitas nos primeiros números de revistas como Journey into Mystery (alienígenas de Pedra), Incredible Hulk (Homens-Sapo) e Tales to Astonish (Extraterrestre Lodoso). Mesmo os Skrulls, que haviam sido apresentados no Nº 02 de Fantastic Four, ainda não haviam se firmado como raça realmente poderosa e dotada de importante articulação com o heróis da Terra. Podemos imaginar que o conceito de ETs ainda era muito influenciado pelo que fora apresentado na década 50, quando os carros-chefe das publicações eram revistas de monstros e alienígenas genéricos. O Super-Skrull começaria em Fantastic Four Nº 18 (sua primeira aparição) de Setembro de 1963 uma longa jornada em direção a um posto importante como representante de uma das maiores raças alienígenas do Universo Marvel.

Miniatura Marvel Nº 60 - Super-Skrull

Antes de mais nada, no entanto, analisemos sua miniatura dentro da Coleção de Miniaturas Marvel da Eaglemoss. A miniatura ficou um pouco aquém da imagem poderosa que em geral o personagem passa. De maneira que algum desavisado admirador da coleção possa até achar que o Super-Skrull é um personagem desconhecido ou mesmo desimportante dentro da Marvel. As nuances da face ficaram pouco definidas, deixando a peça praticamente sem expressão. A pele craquelada da espécie Skrull deve ser difícil mesmo de ser capturada, no entanto mesmo outras personagens da coleção com a mesma característica tiveram um melhor tratamento. A parte muscular também está também pouco definida, não fazendo jus ao histórico de guerreiro deste selvagem Skrull. Como o próprio nome já diz, o "Super" vem do fato do Super-Skrull emular os poderes dos 04 personagens que compõem o Quarteto Fantático: a elasticidade do Sr. Fantástico, a invisibilidade da Mulher-Invisível, a força bruta do Coisa e a combustão do Tocha-Humana. Apesar disso, vemos representado apenas dois destes poderes, a força do Coisa por meio da pele rochosa da mão direita e a combustão do Tocha-Humana no braço esquerdo em chamas.

Miniatura Marvel Nº 60 - Super-Skrull

Todos esses aspectos mais negativos da peça não tiram, no entanto, a importância do personagem, ou mesmo seu direito de estar representado nesta coleção. Vejamos então quem é o Super-Skrull. Kl´rt é o nome do Skrull que se ofereceu para participar de um experimento que lhe daria grande poder ao combinar os poderes do grupo de heróis que era, na época, uma pedra no sapato do Imperador Dorrek, líder máximo do Império Skrull. Mas antes de falarmos disso voltemos um pouco no tempo para o primeiro episódio envolvendo humanos e Skrulls. Foi este episódio que motivou o Imperador à tomar a decisão de criar o Super-Skrull. A Terra entrou para o radar imperialista da raça Skrull na década de 30, mas apenas nos anos 60 é que uma intervenção foi realmente pensada. Alguns espiões foram enviados à Terra e, graças à habilidade transmorfa dos Skrulls, esses espiões conseguiram se infiltrar facilmente em nossa sociedade. Uma frota de naves vieram e orbitaram nosso Planeta levando o Quarteto Fantástico a intervir. Ciente de nossa inferioridade numérica e tecnológica, o Sr. Fantástico (Ree Richards) consegue ludibriar o Imperador Dorrek fazendo-o crer em uma capacidade de defesa que não tínhamos. Dorrek decide então abandonar a invasão e os espiões que estavam na Terra foram deixados à própria sorte, sendo então encontrados e hipnotizados por Reed, passando então a se comportarem como vacas, inclusive na aparência (uma vez que eram transmorfos).

Miniatura Marvel Nº 60 - Super-Skrull

Obviamente, o embuste de Reed foi descoberto por Dorrek que então financia um programa em seu planeta para transformar um soldado (Kl´rt) em um ser que, utilizando-se dos mesmos poderes do Quarteto Fantástico, varreria do Universo a nojenta e abjeta raça humana. Kl´rt, transformado agora em um super soldado chega aos EUA e planta uma bandeira Skrull em plena Times Square. O Quarteto, pego de surpresa pelo ataque e por encontrar um ser que mimetizava exatamente seus próprios poderes, é derrotado. De volta ao Edifício Baxter, Reed se aprofunda então no único poder que o Super-Skrull não emulava, seu intelecto. Reed descobre que os poderes do vilão eram acionados e mantidos em funcionamento a partir de um raio ultrassônico que era continuamente transmitido à Terra a partir do Planeta Skrull. Graças a um dispositivo elaborado por Reed, o Super-Skrull é então derrotado ao ver seus poderes anulados. Essa estratégia de Reed foi suplantada pelos engenheiros Skrulls e rapidamente o  famigerado Super-Skrull voltaria ao embate com o Quarteto.

Miniatura Marvel Nº 60 - Super-Skrull

As batalhas entre o Super-Skrull e o Quarteto Fantástico se seguiram, tendo sempre o Quarteto como vencedor. Este estado de coisas levou o Imperador Dorrek a simplesmente desprezar Kl´rt, vendo-o como um inútil. Com isso Kl´rt passa a experimentar o pior dos sentimentos para um Guerreiro, ou seja, passa a se ver como um Guerreiro inútil e sem honra. Isso alimentou seu ódio pela família fantástica, levando-o a arquitetar diversos planos mortais contra nossa espécie. As coisas teriam um rumo triste e melancólico para o Kl´rt caso disputas internas e acontecimentos externos não tivessem destroçado o Império Skrull. Isso permitiu que uma ambiciosa Skrull chamada S´Byll chegasse ao poder. Para piorar as coisas toda raça Skrull havia perdido uma de suas marcas mais emblemáticas, sua capacidade transmorfa. S´Byll consegue ludibriar o Super-Skrull criando uma improvável aliança entre ele e o Surfista Prateado, unidos para enfrentar uma suposta ameaça à raça Skrull, os reptilianos Badoons. É por meio deste episódio que S´Byll consegue unir o poder cósmico do Surfista com as raras propriedades das células de Kl´rt, restaurando o poder transmorfo de sua raça. Isso alça S´Byll ao posto de Imperatriz da raça Skrull.

Miniatura Marvel Nº 60 - Super-Skrull

Acontecimentos levariam à morte de S´Byll, e quem conseguiria chegar ao poder agora seria Kl´rt. Ele agora seria o monarca que levaria novamente sua raça ao posto que ele, como guerreiro sempre achara que lhe era de direito. Estes sonhos foram interrompidos pela Onda de Aniquilação que irrompeu da Zona Negativa (um universo paralelo ao nosso que possui como Imperador a criatura insetóide conhecida como Aniquilador). Estes eventos foram relatados na Saga Aniquilação na Marvel. Apenas a união de diversos personagens cósmicos da Marvel, dentre eles Nova, Surfista Prateado, Ronan, o próprio Super-Skrull, dentre outros, é que conseguiria deter o Aniquilador, mas isso a partir do sacrifício supremo do Super-Skrull, sendo ele o improvável personagem que consegue deter a Onda de Aniquilação que varria o Universo. Este sacrifício o colocaria em um grande posto dentro do Universo Marvel, passando a ser respeitado e até reconhecido como herói por muitos. Em função da banalidade com que a Marvel vem lidando com a morte de seus personagens, o Super-Skrull voltou a viver, tendo nova participação na luta contra uma segunda Onda de Aniquilação que irrompeu a partir do Território Kree (outra raça alienígena famosa por serem inimigos mortais dos Skrulls). 

Miniatura Marvel Nº 60 - Super-Skrull

Esta nova Onda de Aniquilação forjou uma estranha aliança entre Kl´rt e Ronan, um dos mais importantes personagens dentro da hierarquia Kree. Um estranho respeito nasceu entre os dois guerreiros, permitindo que as histórias envolvendo os dois personagens ganhassem maior dramaticidade e riqueza. A história do Super-Skrull mostra claramente como um personagem que era, pelo menos à princípio, mais um vilão do Quarteto Fantastico, passou a integrar de forma importante o Universo Cósmico da Marvel. E mais, a jornada do Super-Skrull forjou uma personalidade mais complexa e dramática no personagem e  isto o tem colocado ao lado (em minha opinião) de personagens complexos em suas motivações, como por exemplo Dr. Destino e Ciclope.

Miniatura Marvel Nº 60 - Super-Skrull

Bem amigos... É isso. Quem sabe com o estabelecimento da raça Skrull no Universo Cinematográfico da Marvel no último filme da Capitã Marvel, somado à vinda dos direitos do Quarteto Fantástico da Fox para Disney, nós não vejamos um dia a encarnação de Kl´rt nas telas.

Gde. Abraço à todos!
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